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As Custas Judiciais e a falta de Justiça

Intervenção de Miguel Costa Marques, nos Estados Gerais do PNR, no dia 14 de Abril.

Exmo. Senhor Presidente do PNR
Exmo. Senhor Presidente da Mesa do Conselho Nacional do PNR
Exmos. Senhores, Caros Amigos, Caros Camaradas!

Quero, em primeiro lugar, agradecer o convite que me foi feito pelo Presidente do PNR, e meu Amigo Dr. José Pinto-Coelho para proferir uma intervenção nestes Terceiros Estados Gerais do nosso Partido, em que irei abordar um tema que me é peculiar, ao qual não sou insensível, e em que, de resto, já tomei várias posições públicas, tema esse que se prende com um dos grandes problemas com o qual a Justiça se depara em Portugal e que tem que ver com as custas judiciais. Custas essas que, além de serem as mais elevadas dos países membros da União Europeia, constituem elas mesmas um forte obstáculo no que ao acesso à Justiça diz respeito, o que, indubitavelmente, leva à falta de Justiça.

As custas judiciais mais não são do que a prestação que é paga ao Estado por quem necessita de aceder à Justiça e variam consoante a natureza do processo, a espécie de processo, o valor do processo e a fase processual em que o mesmo se encontre. E as mesmas são elevadíssimas, fazendo com que a Justiça, num país com as especificidades e com as características de Portugal, seja inacessível à grande maioria do cidadão comum e/ou da pequena/média empresa.

Para que se tenha uma ideia sobre o montante das custas judiciais, irei agora fazer uma breve análise sobre o respectivo regime e regulamento das mesmas.

Vejamos agora o regime das custas judiciais nos processos civis, administrativos, fiscais e laborais na fase declarativa da acção, ou seja, na fase em que se vai declarar se existe ou não o direito, cuja tutela o autor pretende ver reconhecida. Nestes processos as custas variam consoante o valor da acção e consoante a natureza do litigante, pois se a parte num ano civil dá entrada e/ou é demandada em mais de duzentos processos, as custas judiciais são mais elevadas.

Ora, de acordo com a lei, quando o valor da acção é determinado pelo valor do acto jurídico, ou seja, quando a acção tiver por objecto a apreciação da existência, validade, cumprimento, modificação ou resolução de um acto jurídico, atende-se ao valor do acto determinado pelo preço ou estipulado pelas partes. Assim, com base num valor de € 5.000,00, por exemplo, se se pretende cobrar a dívida, obter o pagamento de uma indemnização a título de danos fixados, impugnar um acto administrativo ou um acto tributário ou anular uma deliberação de uma sociedade que cause um prejuízo à sociedade, o valor da acção é de € 5.000,00. Ao invés, se se pretende fazer valer o reconhecimento do direito de propriedade sobre um bem imóvel, o valor da acção corresponde ao valor do imóvel. E se a acção versa sobre questões imateriais ou se incide sobre o estado das pessoas (uma acção de divórcio, ou uma regulação do poder paternal), o valor da acção corresponde ao valor da alçada do Tribunal da Relação. Abro aqui um pequeno parêntesis para explicar que as alçadas dos tribunais servem para delimitar a possibilidade ou não de recurso das decisões proferidas pelos tribunais de primeira instância para os tribunais superiores. A alçada do tribunal de primeira instância é de € 5.000,01, que significa que as decisões proferidas pelos tribunais de primeira instância em acções de valor inferior a esse montante, salvo raríssimas excepções previstas na lei, não admitem recurso para o Tribunal da Relação. E a alçada do Tribunal da Relação é de € 30.000,01, que significa que as decisões dos tribunais de primeira instância admitem recurso para os Tribunais da Relação se o valor se situar entre os € 5.000,01 e os € 30.000,00. E as decisões proferidas pelos tribunais de primeira instância, em que o valor ultrapasse os € 30.000,01 admitem (desde que preenchidos os respectivos pressupostos legais) recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. Ou seja, das decisões proferidas em sede de recurso pelos Tribunais da Relação pode-se recorrer em acções de valor superior a € 30.000,01 para o Supremo Tribunal de Justiça.

As custas judiciais são fixadas em unidade de conta processual que é indexada ao salário mínimo nacional, sendo que desde 2009 – Governo de José Sócrates – ela não sofre alterações, fixando-se em € 102,00.

Assim, na fase declarativa de um processo civil, laboral, administrativo ou fiscal, consoante o valor da acção e também se se trata ou não de um grande litigante, o valor da taxa de justiça varia entre os € 102,00 e os € 2.448,00. Se as acções forem de valores superiores a € 275.000,00, a essa taxa acresce por cada € 25.000,00 ou fracção a mais, € 459,00 para grandes litigantes.

Tendo em conta que o valor das acções sobre questões imateriais ou que versem sobre o estado das pessoas é de € 30.000,01, a taxa de justiça a pagar numa acção de divórcio ou numa regulação do poder paternal é de € 612,00, ou seja, um filho, para efeitos de custas processuais, vale € 612,00. Todavia, o legislador, certamente consciente que as taxas de justiça são excessivamente altas, concede às partes a possibilidade de pagar as taxas de justiça em duas prestações, devendo a primeira prestação ser paga com a entrada da petição inicial (para quem não entende a linguagem jurídica, trata-se da entrada do processo em tribunal) ou com a apresentação da contestação (quem igualmente não entende linguagem jurídica, trata-se da entrada da defesa em tribunal), devendo a segunda prestação ser paga no prazo de dez dias a contar da notificação do despacho que designa a data da audiência de discussão e julgamento. Se não houver lugar a audiência de discussão e julgamento, então, a lei determina que a segunda prestação da taxa de justiça entre em conta de custas finais, i.é., será paga quando o processo for remetido à conta. E também, atendendo ao elevado número de processos de divórcio e de regulação do poder paternal que correm termos nos nossos tribunais, a lei determina que não há lugar ao pagamento da segunda prestação da taxa de justiça nos processos de jurisdição de menores e nos processos em matéria de Direito de Família. Ou seja, a taxa a justiça a pagar nos processos de divórcio, de regulação do poder paternal, de promoção e protecção de crianças, e em outros processos referentes à jurisdição de menores e do Direito da Família, a taxa de justiça a pagar é de 306,00€ por cada parte. Um filho vale, pois, 306,00€ para efeitos de custas judiciais.

Mesmo que paga em duas prestações, as taxas de justiça nas fases declarativas dos processos civis, nos processos laborais, nos processos administrativos e nos processos fiscais são elevadíssimas e inacessíveis ao cidadão comum e/ou à pequena e média/empresa, fazendo com que as pessoas pensem duas ou mais vezes se optam por recorrer aos tribunais a fim de aí dirimirem os seus conflitos e aí defenderem os seus legítimos direitos e interesses.

Relativamente às execuções, se as diligências de penhora são efectuadas por um oficial de justiça, a taxa de justiça a pagar varia entre os € 102,00 e os € 612,00. Ao invés, se as diligências de penhora são efectuadas por Agente de Execução, esta varia entre os € 25,50 e os € 76,50. Nos casos em que as diligências de penhora são efectuadas por Agente de Execução, aos valores das taxas de justiça acrescem os honorários e despesas do Agente de Execução, que são sempre adiantados pelo exequente, só tendo este a possibilidade de recuperar os honorários e despesas do Agente de Execução, caso venham a ser encontrados bens ao executado. Nos casos em que um executado se pretende opor a uma execução, aí a lei não faz distinção entre pequenos e grandes litigantes. As taxas de justiça variam dos de € 306,00 para execuções de valores compreendidos entre € 0,01 e € 30.000,00 e de € 612,00 para execuções de valor superior a € 30.000,01.

Nas providências cautelares, que são medidas que se tomam em determinados casos previstos na lei a fim de acautelar preventivamente o direito que se pretende fazer valer, a taxa de justiça varia entre € 306,00 e os € 2.244,00. Ao invés, se a providência cautelar versar sobre uma restituição provisória de posse, atribuição provisória de alimentos, arbitramento de reparação provisória, a lei não distingue entre pequenos e grandes litigantes e a taxa de justiça a pagar é de € 102,00.

Igualmente, nos recursos, a lei não distingue entre pequenos e grandes litigantes, sendo que nas acções de valor inferior a € 5.000,00 apenas se pode recorrer caso as mesmas versem sobre acções de despejo ou caso a parte seja condenada como litigante de má-fé. Assim, a taxa de justiça a pagar pela interposição de recurso vai dos € 51,00 aos € 816,00.

Nos processos criminais, quem se pretender constituir assistente, de modo a poder deduzir uma acusação particular (que, nos crimes públicos e semi-públicos está subordinada à do Ministério Público, e, nos crimes particulares, como as injúrias e as difamações é obrigatória a constituição de assistente) tem de pagar à cabeça € 102,00, que pode ser corrigido pelo Juiz a final até € 306,00 consoante a complexidade do processo. Um arguido que pretenda requerer a abertura de instrução (que é a comprovação judicial, isto é, feita por um Juiz, se a acusação do Ministério Público está ou não bem fundamentada e se existem indícios para levar o arguido a julgamento) terá de pagar à cabeça € 102,00, que pode ser corrigido pelo Juiz a final até € 306,00 consoante a complexidade do processo. Um recurso para o Tribunal da Relação tem uma taxa de justiça fixada pelo Juiz a final entre € 306,00 a € 612,00 e um recurso para o Supremo Tribunal de Justiça tem uma taxa de justiça fixada pelo Juiz a final entre € 408,00 e € 816,00.

Finalmente, temos os recursos para o Tribunal Constitucional. Além dos critérios de admissão serem bastante restritivos, os recursos são sempre submetidos a um exame preliminar por parte do Juiz relator, que visa apurar se o recurso deve ou não prosseguir. E na grandessíssima maioria dos exames preliminares, os recursos são liminarmente rejeitados, há lugar ao pagamento de custas que são fixadas pelo Juiz entre € 204,00 e € 1.020,00. E se há lugar ao julgamento do recurso e o mesmo é julgado improcedente, há lugar ao pagamento de justiça entre € 1.020,00 e € 5.100,00, pelo que o Tribunal Constitucional tem um regime de custas proibitivo.

Analisado em traços gerais o regime das custas judiciais em Portugal,  além de Portugal ter as custas judiciais mais elevadas dos países da União Europeia, os montantes das taxas de justiça são inacessíveis à grande maioria dos cidadãos e/ou das pequenas e médias empresas, pelo que são cada vez mais os cidadãos e as empresas, que optam por não recorrer a tribunal a fim de nessa sede dirimirem os seus conflitos e defenderem os seus legítimos direitos e interesses, optando por os resolver nos meios alternativos de resolução de conflitos, em entidades administrativas e privadas, entidades essas desprovidas de competências e de conhecimentos técnico-científicos para administrar a justiça e em que se fomenta o clientelismo, o compadrio, o tráfico de influências e até mesmo a corrupção e em que a parte mais forte, e com mais capacidade financeira é sempre favorecida.

Há ainda também a ter em conta que, não obstante as custas judiciais serem elevadas, os critérios de concessão do benefício de apoio judiciário são muito restritos e apertados, só sendo os mesmos concedidos aos cidadãos que vivam praticamente no limiar da pobreza, ou então às pessoas colectivas sem fins lucrativos com escassíssimos recursos económicos.

O regime das custas judiciais em Portugal impede que muitos cidadãos e empresas acedam à justiça, a fim de dirimirem os seus conflitos e defenderem os seus legítimos direitos e interesses, o que acarreta uma falta de justiça.

Conforme disse António Marinho e Pinto, quando era Bastonário da Ordem dos Advogados, em Portugal, a Justiça é um bem de luxo que o Estado vende a preços de mercado, só sendo a mesma acessível aos multimilionários, que podem pagar as respectivas taxas de justiça, ou então aos indigentes e aos vagabundos, que são aqueles a quem é concedido o benefício do apoio judiciário. Disse.

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